Vem a década de 1940 e, com ela, Grande Othelo sabe da demolição de um espaço de lazer para a construção da Avenida Presidente Vargas, no Centro do Rio de Janeiro. Inconformado, fala com Herivelto Martins e, juntos, criam “Praça Onze” (ou “Bom dia, avenida”), lamento em samba sobre a perda do lugar que se fez todo para o povo, a cultura afro-brasileira e a boemia. Uma das tantas canções da dupla termina com a promessa de cantar o passado dessa região. E é um compromisso semelhante que, agora, firmamos na 71ª Ocupação Itaú Cultural: cantaremos também um passado, a vida e o legado de Grande Othelo, entendendo que o que se foi ganha o presente e aponta futuros, celebrando o artista em sua potência multitalentosa, complexa, questionadora e profundamente negra.
Filho de Minas Gerais e do ano de 1915, Sebastião Bernardes de Souza Prata, ainda criança, já se dava com os palcos: quando pequeno, entrou para o circo e, tempo afora, cresceu nos vários ofícios artísticos, atravessando tragédias (prenunciadas na escolha do nome shakespeariano) e desafiando uma indústria excludente e racista. Tornou-se mestre do magnetismo cênico no teatro, no cinema e na televisão. Na música, dedicou-se, em especial, às letras dadas ao tamborim. E, na poesia, escreveu o afeto, o riso, a dor e a crítica, transformando-se na bela síntese de ator-poema, ele próprio a soma da composição de personagens e versos.
Alguns desses versos, aliás, podem ser lidos na publicação (nos formatos impresso e digital) desta mostra, exposição que conta, ainda, com um site (acesse itaucultural.org.br/ocupacao), no qual há conteúdos inéditos. Realizada em parceria com a Fundação Nacional de Artes (Funarte), detentora do acervo do homenageado, a Ocupação Grande Othelo busca destacar a importância de uma obra que supera o imaginário popular, reveladora de um gênio que troca com outros talentos (da atriz Ruth de Souza à cantora Watusi, do humorista Oscarito à estrela estadunidense-francesa Josephine Baker) e representa uma identidade tão do Brasil – país que se reconhece em Sebastião tal como ele se vê na antiga Praça Onze.
Itaú Cultural