Piano de modelo próximo ao usado pela maestrina, que possuía um Rönisch, fabricado em 1902 Tendo pertencido a Chiquinha Gonzaga até 1935, ano de sua morte, o piano aparece em sua última foto, tirada em 1932, na ocasião de seu aniversário. A compositora trouxe seu piano da Europa em 1909, mesmo ano de fundação do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, que hoje o preserva em seu acervo.
crédito: Acervo Instituto Moreira Salles/Coleção Edinha Diniz/Chiquinha Gonzaga
Piano
"Rio de Janeiro ou “Pianópolis” Ainda em 1856, a presença numerosa desse instrumento sugere a Araújo Porto Alegre a denominação de “Cidade dos Pianos” para a então acanhada sede da corte. Daí em diante ele se torna uma verdadeira praga, no dizer queixoso dos cidadãos de vida pacata."
Trecho retirado do livro Chiquinha Gonzaga: Uma história de vida, de Edinha Diniz
Transcrição de áudio disponível. Clique em para acessar.
Maria Teresa Madeira fala sobre a homenageada da 51ª Ocupação: “Chiquinha é sinônimo de empoderamento feminino”
por Amanda Rigamonti
Mulher, pianista, professora, estudiosa, apaixonada pela vida, pelos filhos e pela profissão. É assim que se define Maria Teresa Madeira, a convidada da vez do Som que Fez o Som.
Nascida na Lapa, no Centro do Rio de Janeiro, e criada em Nova Iguaçu, no subúrbio do mesmo Rio, a musicista se tornou uma das principais intérpretes de Chiquinha Gonzaga, acumulando em sua história inúmeras apresentações e gravações das composições de Chiquinha.
A artista, que define o piano como “o cara”, tem uma trajetória na música que começa cedo, com uma mãe professora de piano e acordeom. Tem hoje mais de 30 discos lançados, e é doutora pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), onde também dá aulas para os cursos de bacharelado e de extensão. Assim, as referências que compartilhou neste Som que Fez o Som são das mais variadas e trazem muito de sua história e memória afetiva familiar.
Antes de mergulhar nas indicações de Maria Teresa Madeira, leia entrevista com a pianista, em que ela conta um pouco de sua história e da relação com o piano e fala sobre Chiquinha Gonzaga, a homenageada da 51ª edição do programa Ocupação Itaú Cultural – que entra em cartaz no dia 24 de fevereiro na sede da instituição.
Maria Teresa, conte um pouco de sua trajetória. Como foi sua infância? Quando e como ingressou na música?
Minha trajetória na música começou cedo. Minha mãe era professora de música (piano e acordeom) e tinha uma academia de música e dança em Nova Iguaçu (RJ). Ou seja, nasci já num ambiente propício. Mas nunca me senti obrigada a estudar música ou dança – e acabei me apaixonando pelas duas coisas.
Sou filha única, meus pais me criaram com muito amor e foram essenciais na minha formação. Morávamos numa casa grande e guardo memórias maravilhosas da minha infância. Brinquei muito, andei de bicicleta, gostava de praia, piscina, e até joguei futebol na rua em que morava, pois era sem saída… Nossa mesa era farta. Gosto de comer bem até hoje!
Fiz o curso técnico de piano lá na academia da minha mãe e depois entrei para a Universidade Federal do Rio de Janeiro, com 17 anos, para fazer o bacharelado em piano. Mais tarde fiz meu mestrado na Universidade de Iowa, nos Estados Unidos, onde morei por três anos. Em 2016, concluí meu doutorado pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, instituição na qual leciono desde 2009. Ensinar música numa universidade pública tem sido uma experiência fantástica. Cada aluno é um universo e traz consigo uma trajetória muito particular. Saber lidar com a diversidade tem me dado um prazer enorme. E ver nos olhos desses alunos a sede por conhecimento é meu maior estímulo.
O que tem de especial no piano, na sua opinião?
As várias facetas do instrumento: som, timbre, abrangência de registros, fora a empatia física que todo instrumentista precisa ter com o instrumento de sua escolha. Sem contar com o repertório escrito para ele, sem mencionar todas as possibilidades de adaptações de variadas formações musicais que ele consegue sintetizar. Ele para mim é “o cara”!
Por que Chiquinha Gonzaga?
Chiquinha surgiu felizmente na minha vida por causa de um projeto que fui convidada a participar em 1995. Ali foi o início de uma paixão eterna… Nesse projeto toquei em quatro concertos e ainda fiz a direção musical do “Forrobodó”, sucesso de Chiquinha, de 1912. Depois, veio a minissérie televisiva, e na sequência três discos. Viajei muito tocando Chiquinha pelo Brasil e pelo mundo: Estados Unidos, Argentina, França, Espanha, Finlândia etc. Novamente em 2013, outra montagem de “Forrobodó”. E em 2020 lancei, em parceria com Wandrei Braga, a coleção chamada Chiquinha Gonzaga para Todos em quatro volumes, todas partituras para piano, organizadas didaticamente por níveis de dificuldade. São 145 músicas pinçadas do acervo digital do site www.chiquinhagonzaga.com. E assim vamos em frente com Chiquinha. Sem parar.
Chiquinha faz do piano, antes um mero ornamento, um instrumento de trabalho. Você poderia falar sobre o impacto dessa transição?
Chiquinha foi uma mulher que acreditava na sua capacidade de criar e de vencer. O piano, primeiramente um mero apetrecho que fazia parte da educação das sinhazinhas de época, acabou virando seu ganha-pão. Depois de um casamento arranjado por seu pai, um homem de prestígio social e político, ganhou um marido possessivo e tão repressor quanto seu pai. Não aceitou. E tudo que lhe restou foi a música. Na verdade, era só isso que ela precisava. Trabalhou duro para se fazer respeitar num ambiente masculino. Ela tocou, compôs, arranjou e escreveu para teatro, o que lhe trouxe o reconhecimento do grande público. Chiquinha prosperou e obteve muito sucesso em vida. E amou muito, do jeito que queria.
Para quem não a conhece: como você apresentaria Chiquinha Gonzaga?
Compositora, pianista, arranjadora, abolicionista, defensora dos direitos autorais, a primeira maestrina à frente de uma orquestra, a primeira pessoa que escreveu uma música especialmente para o Carnaval. Chiquinha é sinônimo de empoderamento feminino. Eu sempre digo que ela lutou dignamente e conseguiu ser respeitada. Chiquinha foi uma heroína, uma mulher à frente de seu tempo, sem nunca perder o rumo de sua vida.
Você é tida como a principal intérprete de Chiquinha Gonzaga. O que lhe rendeu este título e como honrá-lo?
Sinto-me muito honrada em receber esse título de principal intérprete. Mas acho que faço parte do time dos pianistas que tocaram e tocam Chiquinha e reconhecem seu valor como criadora e como um divisor de águas na nossa música. Minha história de vida profissional ficou marcada por alguns compositores e Chiquinha fez e continua fazendo parte dela. Vou continuar com minha eterna pesquisa sobre Chiquinha. Acredito que posso honrá-la desta forma, tocando, escrevendo sobre ela e divulgando sua obra.
Como uma artista contemporânea, o que a move a continuar o legado de Chiquinha?
Há muito ainda que pesquisar, tocar, editar, digitalizar e registrar. O legado continua desse jeito. A curiosidade e a vontade de aprender estimulam o estudo, o conhecimento e inevitavelmente os registros. Eu torço muito para que a nova geração venha com sede e fome de Chiquinha. Prometo que ninguém vai se arrepender.
Capas de partituras compostas por Chiquinha Gonzaga e anúncios em jornais
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crédito: Acervo Instituto Moreira Salles/Coleção Chiquinha Gonzaga
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Seção de vídeo
Ó abre alas, que eu quero passar
A pesquisadora e biógrafa Edinha Diniz e o pianista e pesquisador Wandrei Braga comentam a marcha “Ó abre alas”, composta em 1899 e um marco na obra de Chiquinha Gonzaga. Essa, que foi a primeira música feita especialmente para o Carnaval, é uma canção que permanece no imaginário dos brasileiros, tendo sido assim desde seus primeiros carnavais, uma vez que só foi gravada em disco mais de 70 anos depois de sua composição.