Encenada no teatro e adaptada para o cinema e a televisão, O pagador de promessas é um marco na carreira de Dias Gomes. Escrita em 1959, a obra inicia a segunda fase do autor no teatro, consagrando-o como um dos grandes entre seus contemporâneos.
Considerada uma tragédia clássica, a história acompanha a saga de Zé do Burro para pagar uma promessa feita a Iansã/Santa Bárbara, que salvou seu burro Nicolau. Ele carrega características que nos acostumamos a ver nas obras de Dias Gomes: personagens populares com traços regionais – por vezes, exagerados – e rodeados de questionamentos e embates com a sociedade.
O conflito entre o herói trágico e o fundamentalismo da Igreja, representado pelo personagem Padre Olavo, é o disparador para expor as principais críticas do autor: o mito da liberdade em um sistema capitalista, a religiosidade arcaica, o sincretismo religioso, as injustiças sociais, a reforma agrária, a manipulação e o sensacionalismo da mídia.
A peça foi apresentada pela primeira vez em 29 de julho de 1960, no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC), em São Paulo, sob a direção de Flávio Rangel e com Leonardo Villar no papel de Zé do Burro – imortalizado, posteriormente, na versão cinematográfica – e Nathália Timberg como Rosa.
Foi só na terceira versão, segundo Dias, que a questão do sincretismo religioso foi inserida na trama.
“O sincretismo religioso que dá motivo ao drama é fato comum nas regiões brasileiras que, ao tempo da escravidão, receberam influências de cultos africanos. Não podendo praticar livremente esses cultos, procuravam os escravos burlar a vigilância dos senhores brancos, fingindo cultuar santos católicos, quando, na verdade, adoravam deuses nagôs. Assim, buscavam uma correspondência entre estes e aqueles – a Oxalá (o maior dos orixás) identificou-se com Nosso Senhor do Bonfim, o santo de maior devoção da Bahia; Oxossi, deus da caça, achou o seu símile em São Jorge; Exu, orixá malfazejo, foi equiparado ao diabo cristão. E assim por diante. Por isso, várias festas católicas, na Bahia (como em vários Estados do Brasil), estão impregnadas de fetichismo, com danças, jogos e cantos de origem africana. Entre elas a de Santa Bárbara (Iansan na mitologia negra), que serve de cenário ao drama”, escreveu para o livro Coleção Dias Gomes – os heróis vencidos (1989).
No teatro, ganhou diversos reconhecimentos, entre eles o Prêmio Nacional de Teatro, do Instituto Nacional do Livro, e o Prêmio Melhor Autor Brasileiro, da Associação Brasileira de Críticos Teatrais. Entre os idiomas para os quais a obra foi adaptada estão inglês, espanhol, francês, alemão e italiano.