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Instituição do Sonho

Há territórios que compartilhamos todos. No âmbito físico, o planeta – navegamos esse mesmo barco. Para além dele, o sonho. Todos sonhamos, experimentamos esse desvio em relação à experiência cotidiana. Ou melhor, essa abertura – e para onde ela leva? Culturas diferentes têm respostas diferentes a essa pergunta.

Para Ailton Krenak e para os povos indígenas brasileiros de uma forma geral, o sonho é ao mesmo tempo um contato com o transcendente, uma forma de aprendizado, um diálogo com si e com o mundo.

O sentido da palavra “sonho” se expande, não se restringindo apenas às noites de sono, mas abrangendo a atividade desperta da imaginação e experiências como as da consagração da ayahuasca. Sobretudo, indica algo que potencializa trocas: falar sobre os sonhos é tão importante quanto tê-los. Temos de nos envolver, diz Ailton.

Nesta seção, apresentamos falas de Ailton e outros pensadores indígenas sobre o sonho. Ao longo da Ocupação, publicaremos aqui outros materiais que ampliam nossa visão sobre uma vivência que pode ser mais que onírica.

imagem: Letícia Vieira

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Da disciplina do sonho

“Quando eu sugeri que falaria do sonho e da terra, eu queria comunicar a vocês um lugar, uma prática que é percebida em diferentes culturas, em diferentes povos, de reconhecer essa instituição do sonho não como experiência cotidiana de dormir e sonhar, mas como exercício disciplinado de buscar no sonho as orientações para as nossas escolhas do dia a dia.

Para algumas pessoas, a ideia de sonhar é abdicar da realidade, é renunciar ao sentido prático da vida. Porém, também podemos encontrar quem não veria sentido na vida se não fosse informado por sonhos, nos quais pode buscar os cantos, a cura, a inspiração e mesmo a resolução de questões práticas que não consegue discernir, cujas escolhas não consegue fazer fora do sonho, mas que ali estão abertas como possibilidades. Fiquei muito apaziguado comigo mesmo hoje à tarde, quando mais de um colega das que falaram aqui trouxeram a referência a essa instituição do sonho não como uma experiência onírica, mas como uma disciplina relacionada à formação, à cosmovisão, à tradição de diferentes povos que têm no sonho um caminho de aprendizado, de autoconhecimento sobre a vida, e a aplicação desse conhecimento na sua interação com o mundo e com as outras pessoas.”

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Ailton Krenak, em Ideias para adiar o fim do mundo, p. 51-53

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Da suspensão do céu

Suspender o céu é ampliar os horizontes de todos, não só dos humanos. Trata-se de uma memória, uma herança cultural do tempo em que nossos ancestrais estavam tão harmonizados com o ritmo da natureza que só precisavam trabalhar algumas horas do dia [...]. Em todo o resto do tempo você podia cantar, dançar, sonhar: o cotidiano era uma extensão do sonho. E as relações, os contratos tecidos no mundo dos sonhos, continuavam tendo sentido depois de acordar.

Ailton Krenak, em A vida não é útil, p. 25

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Seção de vídeo

Trazer o sonho à vida

O sonho como saúde. O sonho como conexão. O sonho como aprendizado. O escritor, filósofo e artista visual Ailton Krenak, na esteira da sabedoria dos povos indígenas, compreende o sonhar em um sentido mais amplo. O sonho seria uma experiência central das nossas vidas, a qual podemos ter deixado de lado. Neste vídeo, o homenageado da 70ª Ocupação comenta o tema, em companhia das educadoras Severiá Idioriê e Cristine Takuá, do cineasta Carlos Papá, da liderança indígena Ní Krenak e da escritora Eliane Potiguara.

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Da esperança fantástica

Quando pensamos na possibilidade de um tempo além deste, estamos sonhando com um mundo onde nós, humanos, teremos que estar reconfigurados para podermos circular. Vamos ter que produzir outros corpos, outros afetos, sonhar outros sonhos para sermos acolhidos por esse mundo e nele podermos habitar. Se encararmos as coisas dessa forma, isso que estamos vivendo hoje não será apenas uma crise, mas uma esperança fantástica, promissora.

Ailton Krenak, em A vida não é útil, p. 25

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imagem: Letícia Vieira

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