Festejar a vida
O amor, a luta, as dores
Cantar, dançar. Ser.
(João das Neves)
exposição
Um Brasil enriquecido pela diversidade, permeado de conflitos sociais e políticos e iluminado pelas perspectivas poéticas do teatro é o que transparece na carreira de João das Neves, dramaturgo, ator, diretor e escritor que recebe uma Ocupação no Itaú Cultural, em São Paulo, de 26 de setembro a 8 de novembro de 2015.
A abertura ocorre no dia 26, às 11h. Nesse dia e no dia 27, às 14h em ambos os casos, acontece uma contação de histórias baseada no universo do dramaturgo, com a psicopedagoga Walkiria Garcia, da Rede Internacional de Contadores de Histórias.
A exposição propõe um percurso pelos períodos e pelos lugares mais significativos na trajetória de João, com destaque para o combate à ditadura civil-militar por meio de atividades político-artísticas – como membro do Centro Popular de Cultura (CPC) e do Opinião – e para o convívio com os povos indígenas do Acre e com os congadeiros do interior de Minas Gerais, o que reforçou sua ligação com a tradição popular e a influência dela em sua obra.
Ao lado do engajamento e do deslocamento entre culturas, ressalta-se também a inventividade que João traz à encenação teatral. Nesse sentido, Primeiras Estórias – espetáculo adaptado do livro homônimo de Guimarães Rosa – é talvez o melhor exemplo. A peça era formada por uma série de cenas – entre sequenciais, simultâneas e restritas – espalhadas por um parque. Na Ocupação, o espetáculo é detalhado em um aplicativo interativo disponível no espaço expositivo.
A cenografia, projetada por Rodrigo Cohen, conversa com o conteúdo. Elementos da cultura popular – peças de cerâmica, máscaras e mamulengos, instrumentos e mobiliário – são dispostos em ambientes sensoriais: o público caminha por terra batida, folhas secas, serragem e caquinhos de azulejo, sempre em referência aos universos com que o homenageado entrou em contato nas suas viagens.
Hoje com 81 anos, João continua ativo. Com o apoio da edição 2013-2014 do Rumos – principal programa de incentivo à cultura do Itaú Cultural –, o seu acervo foi digitalizado. Além disso, ele fez a direção de Bonecas Quebradas, outro selecionado do Rumos, e pretende montar Yuraiá – o Rio do Nosso Corpo, texto escrito em 1990 e ainda inédito, a ser encenado por índios e seringueiros.
Madame Satã
Em 29 de setembro, às 20h, o Grupo dos Dez monta Madame Satã, peça dirigida por João e por Rodrigo Jerônimo. O espetáculo conta a história de João Francisco dos Santos, transformista que se tornou símbolo da cultura marginal e urbana do Rio de Janeiro da década de 1970. Por meio do personagem, trata-se dos temas do racismo e da homofobia. Saiba mais na matéria do Terça Tem Teatro.
Para toda a família
Dança, teatro e literatura em uma comédia para crianças e adultos, inspirada em ritmos, adereços e símbolos do Carnaval brasileiro. No fim de semana de 26 e 27 de setembro, às 16h, a Confraria de Dança encenaMirabolante, peça dirigida por João que estreou em 2013. O evento conta com interpretação na Língua Brasileira de Sinais (Libras).
A Confraria de Dança foi fundada por Diane Ichimaru e Marcelo Rodrigues na cidade de Campinas (SP), em 1996. A dupla – selecionada do Rumos Dança 2000-2001, com o solo Aboio – pesquisa linguagens, trabalha em parceria com artistas de outras áreas de expressão artística e cria e mantém espetáculos.
Como citado, o fim de semana também traz uma contação de histórias feita por Walkiria Garcia, da Rede Internacional de Contadores de Histórias, às 14h.
Seção de vídeo
Respeitar o Outro e Saber Ver
Lugares
Travessia. A palavra que fecha Grande Sertão: Veredas, romance de Guimarães Rosa, está em ressonância com a trajetória de João das Neves – os deslocamentos marcam sua personalidade e a construção de sua carreira.
O artista inicia seu percurso no Rio de Janeiro, onde participa do Centro Popular de Cultura (CPC) e do Opinião, dois grupos proeminentes na história do país pelo seu trabalho entre arte e política. Na cidade, um dos polos da cultura brasileira, sua produção recebe destaque. Entretanto– de acordo com a descrição do pesquisador Fernando Mencarelli –, João quis “sair do centro”.
O dramaturgo, em 1986, é convidado a ministrar uma oficina de seis meses no Acre. A estada, porém, se estende por mais de cinco anos. No período, ao passo que o Brasil se redemocratizava, escreve e dirige Tributo a Chico Mendes, em 1989; forma, com atores locais, o grupo Poronga; e produz Yuraiá – o Rio do Nosso Corpo, baseado na cultura dos Kaxinawás, redigido em 1990 e ainda inédito.
Depois, em 1992, outro convite o leva a Minas Gerais. No Parque Fazenda Lagoa do Nado, em Belo Horizonte, encena dez contos do livro Primeiras Estórias, do citado Guimarães Rosa. Também em Minas, a partir do contato com a cantora Titane, sua esposa, passa a conviver com a tradição do congado. Já em 2007, cria com Luciano Siqueira a peça Maria Lira, uma história de resistência cultural.
Talvez um dos aspectos mais significativos de João seja este: a capacidade de sair do estável e de estar aberto ao aprendizado. Travessia.
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Arguto, Fulminante e Dinâmico
Titane é cantora. Seu trabalho cria diálogos com a cultura popular – com destaque para o congado – a música e as artes cênicas. O show Titane e o Campo das Vertentes (2009) tem direção de João, seu marido.
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Teatro de Resistência
Fernando Mencarelli é diretor, pesquisador e professor. Bacharel, mestre e doutor em história pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
“Que coisa mais linda
que eu estou vendo agora…”
(Quadrinha tradicional da Festa de Nossa Senhora do Rosário, no congado de Oliveira, cidade de Minas Gerais)