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No centenário de Paulo Freire, diante de debates sobre seu legado e da possível questão ‘o que devemos seguir ou não das suas propostas’, talvez o que deva mais ser ressaltado é: Paulo Freire não desejava seguidores. O educador insistia: não me sigam, me recriem. O leitor, claro, encontra nos seus livros ideias e ferramentas, criadas segundo o lema de ler o mundo para ler a palavra e desenvolvidas de acordo com uma prática – mas não há nada de definitivo, fechado ali. Caberia ao leitor, a partir dos seus problemas, da sua visão de mundo, reinterpretar, reinventar.

Com esse espírito, nesta seção reunimos alguns diálogos com o trabalho de Paulo Freire, caminhos teóricos e práticos que passam por sua obra, perspectivas de aplicação futura. Também na publicação impressa desta Ocupação você conhece ações nesse sentido.

Paulo Freire discursando em 1991
imagem: Márcio Novaes/Acervo Secretaria Municipal de Educação – Memorial da Educação Municipal

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Quando Paulo Freire aprende

por Angela Biz Antunes

Conheci Paulo Freire primeiramente pelos livros e vivenciando, como professora em sala de aula, a política educacional no período em que ele foi secretário da Educação da cidade de São Paulo. Depois, tive a oportunidade de conhecê-lo pessoalmente, convivendo com ele no Instituto Paulo Freire (IPF). O que me chamava atenção, entre tantos aspectos, era sua abertura ao novo. Penso que ele aprendia porque não se trancava em suas verdades, em suas decisões. Lembro que chegavam ao IPF propostas de projetos a ser realizados em parceria com outras instituições – às vezes, algo diferente do que havíamos definido como prioridade. Ele não se negava a ouvir. Tinha curiosidade. Era rigoroso na busca da compreensão do que estava sendo apresentado. Desafiava o interlocutor. Validava, com ele, o que estava compreendendo: “O que você está dizendo é que… É isso mesmo?”. Suas perguntas provocavam reflexão. Nesse movimento de ouvir, de perguntar, de problematizar, de confirmar, saía da reunião dizendo que havia aprendido coisas novas. Ele mesmo nos dizia: a reunião é pedagógica, a gente aprende e ensina nesses momentos, é também um tempo de formação. Cada reunião exige de nós preparo. O diálogo exige rigor e seriedade.

Testemunhando sua forma de aprender, Paulo Freire muito nos ensinava. Gratidão!

Angela Biz Antunes é diretora pedagógica do Instituto Paulo Freire. Foi professora da rede pública municipal e estadual de São Paulo. É formada em letras e pedagogia, com mestrado e doutorado em educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE/USP). Entre outras publicações, é autora do livro Aceita um conselho: como organizar os colegiados escolares.

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Walter Kohan: viver a filosofia, conviver com Paulo Freire e saber sonhar

por Duanne Ribeiro

Autor de Paulo Freire mais que nunca: uma biografia filosófica (2019), o filósofo Walter Kohan relê Freire tendo em vista cinco “princípios”: vida, igualdade, amor, errância e infância. Por meio desses conceitos, Kohan mostra que, no educador, o pensamento se realiza em um modo de viver – é filosofia como forma de vida, como definiria o pensador Pierre Hadot. Faz-se, desse modo, na existência, em uma prática marcada pelo engajamento com a justiça social e pelo afeto voltado para o outro, pela capacidade de descoberta que não teme errar e pela curiosidade que não se deixa fenecer. Propusemos a Kohan uma entrevista em que tratasse dessas noções na sua própria trajetória, mantendo o diálogo com Freire e dando indicações, ao leitor que as queira, de como exercer aqueles ideais freirianos.

Você também busca realizar a filosofia como forma de vida que aponta em Freire? Quais são as diferenças e as proximidades entre a sua atuação e a dele? No livro, você fala de como abandonou certo modelo de filosofia mais preso à erudição. Como foi o processo de deixar tal modo de pensamento e que passos alguém pode tomar para ir além dele?

Sim, busco. É uma autoexigência e uma luta viver como se pensa, e como vamos pensando diferentemente essa exigência nos leva a viver diferentemente. É um desafio. As comparações são sempre inconvenientes… Histórias, tempos, contextos muito diferentes… Sim, abandonei certo modo de me relacionar com a filosofia para abrir outro: houve inspirações várias, como dois criadores de um programa de filosofia para crianças, Matthew Lipman e Ann Sharp, que foram importantes porque me mostraram praticamente outro modo de fazer filosofia.

E depois vamos caminhando e abrindo o caminho aos encontros. Não há passos para ir além: como diz Paulo Freire inspirando-se em Antonio Machado, o caminho se faz caminhando. Talvez seja necessário alimentar a própria curiosidade, a inquietação, ou seja, a própria infância, que é uma boa companheira para caminhar… E ter certa insatisfação com o mundo. Aqui no Brasil temos muitos motivos para estar insatisfeitos e inquietos com o mundo em que vivemos.

A errância, assim como para Paulo Freire, é um “método” à sua disposição? Gostaria que comentasse como isso se passa na obra freiriana e na sua trajetória e que respondesse: em uma sociedade tão voltada para o sucesso, como se permitir o erro, aprender a errar?

A errância não é um método. Não gosto dos métodos. Prefiro pensar, a princípio, nos sentidos para caminhar. Você sabe que método vem de uma palavra grega que significa “caminho”. Não há um caminho antes de caminhar. É preciso caminhar com certas companhias: o desejo de querer sair de um lugar; sensibilidade e atenção para o que se nos aparece no caminho e para sentidos que nos ajudem a andar sem antecipar o destino da caminhada. As caminhadas mais interessantes são aquelas que não sabemos aonde nos levam até que caminhamos. As boas companhias são igualmente importantes.

Paulo também afirma que ele não tem um método, embora tenha escrito sobre o método. Diz algo mais: que cada educador é seu método, o que equivale a dizer que não há um método. Paulo Freire não tinha método, mas tinha curiosidade e compromisso político com os oprimidos e oprimidas. Isso é inegociável, mas o caminho está aberto. Claro que é muito difícil, hoje, viver sem método, mas faz parte da caminhada enfrentar uma sociedade que está se destruindo a si própria. Como se aprende a errar? Errando. Como se aprendem todas as outras coisas, experimentando-as. Quando você encontra o gosto de errar e de se relacionar afirmativamente com o erro, nos dois sentidos de equívoco e de deslocamento, não há sociedade que o convença de que não é bom errar.

Você descreve Paulo Freire como “menino filósofo”, fala de uma infância perene que caracteriza a sua pessoa. A definição de infância que você dá é esta: “Infância como uma forma de experienciar o tempo, de habitar o presente, de se apresentar como uma presença curiosa, duvidante, atenta, inquieta, perguntadora, expectante”. Você acredita que conseguiu incorporar essa postura, e como esse ideal opera em você? Que sugestões daria a quem quisesse aprender essa forma de ser?

Que tento, tento… E muito… Cuidar e manter viva minha infância, esse tempo infantil. Como você diz, não é fácil em nossas instituições, mas eu tento. Trabalho na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), onde criamos, já faz mais de 20 anos, o Núcleo de Estudos de Filosofias e Infâncias. É um grupo de pesquisa, ensino e extensão de uma universidade pública. E claro que em parte existem processos bem adultos para participar do grupo, como editais, seleções e convênios. Mas eu diria que a condição fundamental para participar desse grupo é justamente certa relação de intimidade com a infância. Claro que a infância é algo plural, por isso somos um núcleo de infâncias, e cada um a cultiva e a encontra à sua maneira… Eu diria, como sugestão, tentar escutar e atentar mais para as infâncias. Podemos começar pelas crianças, atentar para a sua maneira de habitar o mundo, para a sua relação com as coisas e os seres, para as suas perguntas…

No sentido das perguntas anteriores, em outro trecho você fala que se encontra em um “estado de aprendizagem”, que aprendeu com Paulo Freire e outros. Gostaria que falasse sobre esse estado, como Paulo Freire o ajudou a chegar a ele.

Acho que Paulo Freire chama isso de outras formas, como “ser mais”, “inédito viável”, “esperançar”… Quero dizer por “estado de aprendizagem”, sobretudo para educadores, que temos uma tendência a pensar que possuímos coisas a ensinar; vale a pena se ver como seres sempre abertos a pensar de outra maneira, a ser de outro modo, a viver diferentemente… Algo assim como perceber que somos seres bastante pequeninos, que nossos saberes são muito menores em relação aos não saberes e que a vida pode ser uma extraordinária aventura de aprendizagens.

Para dois dos princípios que você trabalha, o amor e a igualdade, parece-me difícil colocar questões como as anteriores: nelas eu pergunto sobre como aprender a errância, a infância, e neste caso não sei se esses outros podem ser ensinados. É talvez a velha questão dos diálogos socráticos (“Pode a virtude ser ensinada?”). Então, é como se o amor e a igualdade freirianos só pudessem atingir quem já acreditasse neles antes mesmo de lê-lo. É assim? Ou podemos construir pontes até esses conceitos?

É uma ótima questão… É difícil… Talvez o que possamos fazer é colocar esses princípios em lugares diferentes. Porque a igualdade é algo que muitos dizem que queremos alcançar em educação. E claro que é importante lutar por algumas formas de igualdade. Mas há um tipo de igualdade que é necessário colocar no início, como ponto de partida, se queremos afirmar uma educação politicamente diferente da instituída. Algo assim como confiar em que “qualquer ser humano pode aprender qualquer coisa se oferecermos as condições para isso”, ou seja, enfrentar a lógica dos mais e dos menos capazes, dos mais e dos menos esforçados, que é uma lógica que legitima e reforça uma sociedade que vive de desigualdades, exclusões, injustiças.

É preciso confiar na igualdade das capacidades para poder conversar de igual para igual com nossos educandos e educandas. O amor é também muito complexo… O que é o amor? Um sentimento? Sim, mas também uma força, uma energia, uma crença, como diz [o filósofo francês] Alan Badiou, de que sempre pode nascer um novo mundo, de que a diferença está antes da identidade… Claro que sua pergunta ainda persiste: podem essas coisas ser ensinadas? Podem ser aprendidas? Como?

Paulo Freire diz que não devemos segui-lo, mas reinventá-lo. Em uma citação que você traz no livro, ele usa mesmo uma palavra mais forte: devemos destruí-lo. Para além dos efeitos imediatos dessas palavras, não parece tão simples saber o que isso significa. O que você diria que significa reinventar o filósofo? Como destruir Paulo Freire?

Alguns têm tomado isso de forma exageradamente literal [risos]. Suas perguntas são muito interessantes. Por isso mesmo, difíceis de responder e interessantes deixá-las em aberto. E acompanhá-las com outras perguntas: para que reinventá-lo? Em que medida essa reinvenção nos ajuda a enfrentar os desafios do momento que vivemos? Sabe que a palavra inventar vem de um verbo latino, venire, que significa “vir”, e do in, que indica “dentro”; invento é o que criamos, mas também o que chegou dentro. Para que algo entre, é preciso abrir as portas, as janelas da casa, fazer espaço e dar tempo… Então eu não quero destruir Paulo Freire, mas conviver com ele; que ele nos ajude a pensar e nos ajude a encontrar o que somos.

Por fim, gostaria que você comentasse caminhos que acredita estarem abertos para quem queira trabalhar com Paulo Freire. No seu livro, você falou dos princípios que nos fazem retomar Paulo Freire hoje. Talvez a pergunta aqui seja: como pensar Paulo Freire amanhã? No seu próprio trabalho, tem realizado algo nesse sentido?

É muito difícil pensar em outro tempo que não seja o presente. Sinto que hoje a vida e a obra de Paulo Freire têm uma potência extraordinária; são muito generativas… Os problemas que vivemos hoje são uma atualização de alguns problemas que Paulo Freire já enfrentou, mas amanhã está muito longe… Como saber o que enfrentaremos amanhã? A gente sonha, isso é o que podemos fazer no presente, esperançar, sonhar, amar… Deixemos o amanhã para amanhã; já temos o bastante no hoje.

Walter Kohan é professor da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Em filosofia, é pós-doutor pela Universidade Paris 8, na França, doutor pela Universidade Iberoamericana, no México, e graduado pela Universidade de Buenos Aires (UBA), na Argentina. Dedica-se à filosofia da educação, infância e ensino da filosofia, entre outros temas. Veja outras obras suas no site da editora Autêntica. Acesse também a entrevista “Por que ler Paulo Freire em tempos de pandemia”, do canal Agenciamentos Contemporâneos, e a aula magna “O que significa pensar (hoje) com Paulo Freire”, ministrada por ele na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (FE/USP).

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Buscar o Sonho

"[...] para mim, é impossível existir sem sonho. A questão que se coloca é, em primeiro lugar, saber se o sonho é historicamente viável. Segundo, se a viabilidade do sonho demanda um pedaço de tempo e de espaço a caminhar. Terceiro, se demanda um espaço ainda longo para caminhar e viabilizar, é o caso de se aprender como caminhar e, em caminhando, reaprender inclusive a realizar o sonho, quer dizer, buscar os caminhos do sonho."

("Essa escola chamada vida", entrevista de Ricardo Kotscho com Paulo Freire e Frei Betto, página 86)

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Seção de vídeo

Diálogos com Paulo Freire: a saúde do trabalhador

A cirurgiã-dentista Adriana Palú comenta sobre a saúde do trabalhador da área da saúde no contexto da pandemia e afirma que as decisões são tomadas de forma verticalizada, não levando em conta a realidade daquele sujeito. Ela pontua que, de acordo com as propostas de Paulo Freire, essas decisões não seriam verticalizadas, pois elas partiriam da realidade, dialogando com o contexto do sujeito, com um debate pautado na amorosidade, pressuposto fundamental para o educador.

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Paulo Freire e a disciplina positiva: um diálogo póstumo

por Fernanda Castello Branco

Apesar de Paulo Freire nunca ter citado o termo disciplina positiva em sua bibliografia, encontramos pontos de convergência entre seu pensamento e essa abordagem baseada nas ideias do psicólogo austríaco Alfred Adler (1870-1937). Tanto a disciplina positiva quanto a teoria freiriana incentivam uma educação humanista, respeitosa e inclusiva. Mas há mais pontos de convergência? Quais são os desencontros?

Partindo apenas de uma suspeita, conversamos com Bete P. Rodrigues*, professora há mais de 30 anos e tradutora de sete livros da série Disciplina positiva, entre outros materiais da Editora Manole, a fim de entender o que podemos “ler” desses dois tipos de pensamento que buscam, em suma, a autonomia do ser humano.

Como você apresenta a disciplina positiva a quem nunca ouviu falar dela?

A disciplina positiva é uma abordagem socioemocional baseada nas ideias de Alfred Adler e desenvolvida inicialmente pela doutora Jane Nelsen – ela é a autora do livro Disciplina positiva, bestseller lançado nos Estados Unidos no início dos anos 1980. Trata-se de uma abordagem não punitiva e não permissiva que oferece ferramentas práticas aos pais e professores que querem desenvolver habilidades de vida em seus filhos e alunos e lidar com os comportamentos desafiadores das crianças e adolescentes. A disciplina positiva é baseada no respeito mútuo, por isso defende uma liderança gentil e firme ao mesmo tempo, e a importância da conexão (pertencimento e importância) entre adultos e crianças.

É eficaz a longo prazo porque considera as crenças da criança por trás dos seus comportamentos e foca no desenvolvimento da sua autonomia e poder pessoal. É uma abordagem não punitiva porque não acredita na eficiência a longo prazo das punições. Na hora de aplicar um castigo em uma criança e adolescente, pode parecer que funciona, mas as consequências são desastrosas: crianças maltratadas na infância podem tornar-se adultos medrosos, inseguros, rebeldes, vingativos, dissimulados, com baixa autoestima etc. Também não é uma abordagem permissiva – Adler, há mais de cem anos, já criticava os perigos da superproteção, porque crianças mimadas não conseguem desenvolver sentimentos sociais: tornam-se dependentes e déspotas, à espera de que a sociedade atenda seus desejos egoístas.

Em linhas gerais, o que você vê de diálogo entre o pensamento freiriano e a disciplina positiva?

Há muitos pontos em comum: tanto a disciplina positiva quanto a teoria freiriana incentivam uma educação humanista, respeitosa e inclusiva, focam no desenvolvimento socioemocional, em especial na autonomia do ser humano. Por exemplo, tanto Paulo Freire quanto Alfred Adler enxergam a educação como uma oportunidade de ruptura da opressão dos indivíduos. E também defendem uma ação “refletida”. Freire criticava a “educação bancária”, na qual o professor é o modelo de transmissão de conhecimentos; e o aluno, um mero receptor. Salientava que uma educação autoritária (representada pela relação entre opressor e oprimido) precisava ser rompida para atingirmos a autonomia.

Paulo Freire explicava que humanização é o “processo de tornar-se mais humanos, completos como pessoas sociais, históricas, pensantes, comunicativas, transformativas, criativas que participam no e com o mundo”. E defendia que os educadores devem “ouvir seus alunos e construir a partir do seu conhecimento e experiências para que se sintam engajados […] abordagens educacionais personalizadas que ampliam os objetivos de humanização e transformação”. Essa citação (em inglês) está em um dos mais importantes livros escritos sobre educação socioemocional: Handbook of social and emotional learning1. A disciplina positiva também foca no desenvolvimento socioemocional das crianças e adolescentes.

Que palavra une, a seu ver, as duas linhas de pensamento, a de Paulo Freire e a da disciplina positiva?

Autonomia. E também consciência social. Talvez Alfred Adler não usasse a palavra autonomia em seus livros (a disciplina positiva usa!), mas defendia o desenvolvimento dos seres humanos através da “responsabilidade social” ou do “senso de comunidade”. Adler cunhou a palavra alemã gemeinschaftsgefühl, que significa ter real preocupação por uma pessoa e um desejo sincero de fazer uma contribuição para a sociedade.

Freire, por sua vez, criou o movimento da pedagogia crítica, fez um trabalho de renome internacional na alfabetização de adultos e, por sua obra, é mundialmente reconhecido como filósofo e educador. Ele defendia a práxis – “reflexão e ação dos homens sobre o mundo para transformá-lo. Sem ela, é impossível a superação da contradição opressor-oprimidos”.

E o que você vê de diferenças entre as duas correntes de pensamento?

Alfred Adler, Rudolf Dreikurs, Jane Nelsen, Lynn Lott e a maioria dos autores da disciplina positiva vêm da psicologia e de um contexto sócio-histórico-cultural muito diferente de Freire. Adler e Dreikurs eram vienenses e emigraram para os Estados Unidos. Nelsen e Lott, americanas. A disciplina positiva foca em mães e pais, além de educadores.

Já Paulo Freire é brasileiro, nordestino, começou sua trajetória profissional como professor e atuou fortemente na educação e na política, sendo inclusive exilado. Focou na pedagogia e na formação de educadores, pois acreditava no poder da educação para fortalecer o oprimido e tornar possível o desenvolvimento da autonomia.

Portanto, autores de cenários e bases teóricas diferentes, mas as duas correntes com o mesmo olhar humanista e foco na transformação social.

Assim como o pensamento de Paulo Freire extrapola os limites da pedagogia, podendo ser aplicado em várias áreas de conhecimento, como você vê essa expansão de atuação na disciplina positiva? Ela deveria interessar a todos nós, certo?

Adler, Dreikurs, Nelsen, Lott e outros da disciplina positiva viajaram muito pelo mundo dando palestras e divulgando uma educação respeitosa não só nos lares e nas salas de aula, mas na sociedade como um todo e em todos os tipos de relacionamento.

Freire tornou-se o Patrono da Educação Brasileira e é o autor do terceiro livro mais lido no mundo na área da educação: Pedagogia da autonomia. Suas obras são referenciadas no mundo todo. A psicologia adleriana vem sendo muito difundida através da disciplina positiva (que está hoje em mais de 70 países e em mais de 50 línguas).

“The process of becoming more fully human as social, historical, thinking, communicating, transformative, creative persons who participate in and with the world.” Educators, he argued, must “listen to their students and build on their knowledge and experiences in order to engage in … personalized educational approaches that further the goals of humanization and transformation.” (Freire citado em Salazar, 2013, p. 126). Salazar, M. (2013). A humanizing pedagogy: reinventing the principles and practice of education as a journey toward liberation. Review of Research in Education, 121-148.

Bete P. Rodrigues é mãe há 24 anos e professora há mais de 30. Formada em letras pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), tem mestrado em linguística aplicada pela mesma universidade. Atualmente é palestrante, coach para pais, consultora em educação e professora da PUC/SP desde 2006, com o curso práticas socioemocionais e a disciplina positiva. Tem larga experiência como professora, coordenadora e diretora pedagógica em diferentes contextos (escolas de línguas, escolas particulares e públicas, ONGs). É trainer em disciplina positiva para profissionais da educação e da saúde certificada pela Positive Discipline Association e tradutora de sete livros da série Disciplina positiva, entre outros materiais da Editora Manole.

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“Paulo dizia sempre: nunca estou certo de minhas certezas. Mudar não é uma vergonha, o conhecimento é histórico.”

Ana Maria Aráujo Freire, viúva, em depoimento ao Itaú Cultural

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