Lambe-lambe

Lua na água

Poema original do livro Caprichos e Relaxos, de 1983 | imagem: divulgação

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Pareça e Desapareça

Parece que foi ontem.

Tudo parecia alguma coisa.

O dia parecia noite.

E o vinho parecia rosas.

Até parece mentira,

tudo parecia alguma coisa.

O tempo parecia pouco,

e a gente se parecia muito.

A dor, sobretudo,

parecia prazer.

Parecer era tudo

que as coisas sabiam fazer.

O próximo, eu mesmo,

Tão fácil ser semelhante,

quando eu tinha um espelho

pra me servir de exemplo.

Mas vice versa e vide a vida.

Nada parece com nada.

A fita não coincide

com a tragédia encenada.

Parece que foi ontem.

O resto, as próprias coisas contem.

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Campo de sucatas

saudade do futuro que não houve

aquele que ia ser nobre e pobre

como é que tudo aquilo pôde

virar esse presente podre

e esse desespero em lata

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Vazio Agudo

Arte original do livro Winterverno. Manuscrito de Paulo Leminski, desenho de João Virmond | imagem: divulgação

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La vie en close

Senhor que prometestes
a vida eterna aos filhos de São Bento
obrigado pelos invernos ao vento
e pelo invento do inferno
ainda aqui nesta terra

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Para a liberdade e luta

me enterrem com os trotskistas

na cova comum dos idealistas

onde jazem aqueles

que o poder não corrompeu

me enterrem com meu coração

na beira do rio

onde o joelho ferido

tocou a pedra da paixão

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Inédito

Poema inédito de Paulo Leminski | imagem: arquivo da família Leminski

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Asas e Azares

Voar com asa ferida?

Abram alas quando eu falo.

Que mais foi que fiz na vida?

Fiz, pequeno, quando o tempo

estava todo do meu lado

e o que se chama passado,

passatempo, pesadelo,

só me existia nos livros.

Fiz, depois, dono de mim,

quando tive que escolher

entre um abismo, o começo,

e essa história sem fim.

Asa ferida, asa

ferida,

meu espaço, meu herói.

A asa arde. Voar, isso não dói.