A origem

A história do Ilê Aiyê mistura-se à história da vida de Mãe Hilda e do terreiro Ilê Axé Jitolu.

Por aproximadamente 20 anos, o terreiro serviu ao bloco como diretoria, secretaria, salão de costura e recepção de associados. A conexão entre os dois transcende o espaço: o Ilê tem em Mãe Hilda sua fonte de inspiração, conselho e apoio; e na religião sua fortaleza e sustentação.

No Carnaval, o Curuzu é palco de um ato cultural-religioso, a bênção para a saída do bloco, que se manifesta com uma orquestra de dezenas de percussionistas e o coral negro em uma celebração. Até 2009, Mãe Hilda foi a responsável por esse cortejo real, que oferece milho branco cozido e pipoca, alimentos de predileção de Oxalá, orixá da paz, e de Obaluaê, patrono da saúde. Em seguida, uma revoada de pombas brancas anuncia a saída da Deusa do Ébano e o início do desfile de Carnaval do grupo, na subida da ladeira do Curuzu.

Atualmente, o ritual é realizado pela filha e sucessora de Mãe Hilda, Hildelice Benta dos Santos (Salvador, 1960), a Doné Hildelice, mantenedora da tradição de cada detalhe do evento que é um marco cultural de Salvador. Doné é um termo do candomblé jeje para uma sacerdotisa.

Vovô e Mãe Hilda, 1999 | foto: Mario Cravo

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A religiosidade dentro do Ilê Aiyê

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Vovô do Ilê

Antonio Carlos dos Santos Vovô (Salvador, 1952) é presidente e fundador do Ilê Aiyê, uma lenda do Carnaval baiano e importante personalidade do movimento negro brasileiro. O apelido vem da infância, quando ia para a escola vestindo um terno maior que o seu tamanho, e, mais tarde, é oficialmente registrado como parte de seu nome.

No primeiro Carnaval do Ilê Aiyê, Vovô saiu tocando um timbal. Conhecia bem os tambores e seus poderes sagrados. Ogã (sacerdote) mais velho do terreiro Ilê Axé Jitolu, é lembrado por sua beleza e alegria, o mais belo dos belos da Liberdade. Seus irmãos, Dete Lima (Salvador, 1952), Vivaldo Benvindo (Salvador,1954) e Hildelice dos Santos (Salvador, 1960), integram o bloco desde a fundação e ocupam lugar de destaque na organização. Seus filhos, sobrinhos, vizinhos, todos se juntaram ao Ilê, que irradia e se propaga em seu entorno.

Nos anos 1970, no auge da juventude, ele tinha um próspero emprego no polo petroquímico de Salvador, que resolveu abandonar assim que o bloco começou a ser maior que o esperado. Mãe Hilda o apoiou na decisão e o que ele pensou para o Carnaval deu sentido à vida de seus familiares, produziu orgulho em uma comunidade, propagou a beleza de um povo.

 

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Retratos do Mundo Negro

ensaio realizado em julho de 2018, no Curuzu, em Salvador (BA)

 

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O resgate da ancestralidade e o futuro

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Identidade Visual

Em 1978, a identidade visual do Ilê Aiyê foi criada pelo artista Jota Cunha (José Antonio Cunha – Salvador, 1948): uma máscara africana com quatro búzios abertos formando uma cruz na testa. O autor a chamou de perfil azeviche e pontua que o termo “máscara” é uma denominação utilizada no Brasil. “Com certeza, cada etnia, no continente africano, tem o seu próprio nome para esse símbolo”, explica.

As máscaras são objetos ritualísticos de grande importância na cultura de muitos países da África: talvez sejam uma das mais conhecidas expressões visuais de seus povos. “A natureza e os humanos estão impressos ali, nessa transcendência de formas espirituais”, pondera Jota. A principal função dessas metáforas materializadas é ser uma representação da coletividade. Azeviche é um mineral negro associado ao barro preto das terras da Liberdade e à pele negra.

As cores do bloco são branco, preto, amarelo e vermelho, e representam, respectivamente, a paz, a cor da pele, a riqueza cultural e a beleza, e o sangue derramado na luta pela libertação.

Dete Lima, estilista do Ilê Aiyê, também contribuiu de forma significativa para a concepção visual do bloco. Responsável pela criação e pela amarração dos turbantes e das fantasias feitas a partir dos tecidos estampados, a também diretora desenvolvia modelos utilizando pequenas bonecas feitas à mão.

“Falar do Ilê Aiyê é falar de uma memória africana viva: há uma geração trabalhando, cantando, escrevendo, praticando arte, vivendo isso”, arremata Jota. Uma geração que, em si, carrega quem antes veio e vislumbra uma continuidade sem fim.

Perfil Azeviche | Jota Cunha

Perfil Azeviche | Jota Cunha

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Linha do tempo

Década de 1970

Entre o final dos anos 1960 e o início dos 1970, ocorreu nos Estados Unidos o auge do movimento black power, que apregoava o orgulho racial e a criação de instituições políticas e culturais comprometidas com a autodeterminação das pessoas de ascendência africana

1970 – As ideias do Négritude – movimento de valorização da cultura negra em países africanos ou da diáspora surgido na França, mas de matriz antilhana e africana – são difundidas no Brasil, por meio sobretudo das obras de Aimé Césaire (Martinica, 1913-2008), Léon Damas (Guiana Francesa, 1912 – EUA, 1978) e Léopold Sédar Senghor (Senegal, 1906 – França, 2001).

As ideias de Frantz Fanon (Martinica, 1925 – EUA, 1961), autor dos livros Pele Negra, Máscaras Brancas (1963) e Os Condenados da Terra (1961), assim como as perspectivas, narrativas e utopias dos líderes afro-americanos assassinados com dois anos de diferença Malcolm X (EUA, 1925-1965) e Martin Luther King Jr. (EUA, 1929-1968) circulam no movimento negro brasileiro.

13/10/1970 – Prisão em Nova York (EUA) de Angela Davis (EUA, 1944), ativista acusada injustamente de conspiração, sequestro e homicídio. Esse episódio alcançou notoriedade internacional. Durante a campanha em sua solidariedade, John Lennon e Yoko Ono compuseram a música “Angela em sua homenagem e os Rolling Stones gravaram “Sweet Black Angel, cuja letra pedia a sua libertação. Angela Davis acabou sendo inocentada.

1972 – A Organização das Nações Unidas (ONU) estabelece o dia 25 de maio como o Dia da África ou o Dia da Libertação da África. A data recorda a luta pela independência do continente africano, contra a colonização europeia e contra o regime do apartheid.

20/01/1973 – Morre assassinado Amílcar Cabral (Guiné Bissau, 1924 – Guiné, 1973), poeta e revolucionário que lutou pela liberdade de Guiné-Bissau e Cabo Verde.

24/09/1973 – Independência da Guiné-Bissau do domínio colonial português.

1974 – James Brown (EUA, 1933-2006) – cantor, dançarino e um dos maiores expoentes da música soul – faz uma turnê pela África. Admiradores da música de Brown, incluindo Miles Davis (EUA, 1926-1991) e outros músicos negros, passaram a se apropriar do “rei do soul” como influência em seus próprios estilos afro-diaspóricos.

Década de 1970 – O movimento black soul faz grande sucesso no Rio de Janeiro, protagonizado especialmente por jovens negros dos subúrbios, que, inspirando-se em mensagens de autoestima, nos símbolos identitários afro-americanos e na dança e musicalidade, agitam a cena cultural. O black soul se disseminou por cidades como Salvador, Recife, Porto Alegre, Belo Horizonte e São Paulo.

1974 – Fundação do Ilê Aiyê, associação carnavalesca que se concentraria em temas africanos e seria composta apenas de negros. Sua sede estava no terreiro Ilê Axé Jitolu, na ladeira do Curuzu, no bairro da Liberdade, periferia majoritariamente negra de Salvador (BA). O bloco fez sua estreia no Carnaval de 1975.

25/06/1975 – Independência de Moçambique do domínio colonial português.

Década de 1970 – Artistas e músicos brasileiros – como Martinho da Vila (Duas Barras/RJ, 1938), Gilberto Gil (Salvador, 1942) e Jorge Ben (Rio de Janeiro, 1942) – realizam viagens à África e procuram incorporar a sonoridade do Atlântico Negro em suas produções musicais.

5/07/1975 – Independência de Cabo Verde do domínio colonial português.

27/08/1975 – Falecimento de Selassie ou Hailé Selassié (Etiópia, 1892-1975), imperador da Etiópia, que se converteu em mito no imaginário negro diaspórico. Para os adeptos do movimento rastafári, era uma espécie de Deus (Jah) encarnado, o messias redentor.

1975 – A República do Daomé, um país localizado na África Ocidental e ex-colônia francesa, muda o seu nome para República Popular de Benim, uma referência à baía de mesmo nome, no litoral do país.

11/11/1975 – Independência de Angola do domínio colonial português.

16/06/1976 – Dia internacional de solidariedade à luta do povo negro da África do Sul. A data foi instituída pela ONU em razão do Levante de Soweto, quando estudantes foram assassinados em manifestação contra o ensino obrigatório da língua africânder.

1977 – A série Raízes – baseada no livro Negras Raízes, de Alex Haley (EUA, 1921-1992), e que conta a saga do herói Kunta Kinte, um escravizado que nasceu na Gâmbia, na África – é exibida na TV nos Estados Unidos. Causou grande impacto na população afro-americana, fazendo-lhe despertar o interesse pelas suas origens familiares e étnicas africanas. No Brasil, a série foi exibida pela Rede Globo no final da década de 1970 e reprisada pelo SBT na década seguinte, provocando não menos consciência racial no seio da população afro-brasileira.

15/01/1977 – Início do II Festival Mundial das Artes Negras, realizado em Lagos, na Nigéria. Discutiu as bases para uma política cultural na África e serviu de espaço para os povos africanos e da diáspora demonstrarem contribuições artísticas.

24/08/1977 – Início do Primeiro Congresso de Cultura Negra das Américas, na Colômbia.

12/09/1977 – Morre assassinado Stephen Bantu Biko (África do Sul, 1946-1977), líder sul-africano idealizador do movimento da consciência negra.

7/07/1978 – Ato em frente ao Theatro Municipal de São Paulo contra o racismo marca o lançamento público do Movimento Negro Unificado Contra a Discriminação Racial, depois abreviado para Movimento Negro Unificado (MNU).

4/11/1978 – O MNU declara 20 de novembro o Dia Nacional da Consciência Negra.

1979 – O Ilê Aiyê cria a Noite da Beleza Negra para a escolha da “Deusa do Ébano – a Rainha do Ilê”, símbolo feminino do bloco que ocupa lugar de destaque em seu desfile anual. O concurso tornou-se o maior concurso de beleza e exaltação da mulher negra no Brasil e costuma acontecer 15 dias antes do Carnaval de Salvador.

23/03/1979 – É fundado o bloco afro Malê Debalê no bairro de Itapuã, em Salvador.

25/04/1979 – É fundado o Olodum, bloco que cultiva o senso de continuidade dos valores socioculturais africanos em Salvador.

10/09/1979 – Morre Agostinho Neto (Angola, 1922 – Rússia, 1979), médico, escritor e liderança política angolana que liderou o movimento de libertação nacional do domínio colonial português.

 

Década de 1980

Sedimenta-se o processo do movimento negro brasileiro de revalorização da África. Seus veículos de comunicação – jornais e revistas que constituíam a chamada imprensa negra – celebram a matriz cultural afrocentrada a partir da música, da dança, da religiosidade e dos hábitos culinários, assim como difundem uma estética dita afro, que abrange as maneiras de se vestir, os cabelos e os adereços.

Apogeu do processo conhecido como reafricanização do candomblé, quando vários sacerdotes e sacerdotisas preconizam um retorno às origens dos cultos (rituais, cantigas, trajes, comidas, artefatos), realizam viagens à África para fins de aprendizado, resgate e aperfeiçoamento e, a partir de um discurso de pureza, rejeitam o sincretismo religioso.

18/4/1980 – Independência do Zimbábue, país da África Subsaariana, do domínio colonial inglês.

1981 – Conferência Mundial da Tradição dos Orixás e Cultura foi realizada na cidade de Ilê Ifé, na Nigéria.

13/11/1981 – Morre Vicente Ferreira Pastinha (Salvador, 1989-1981), mais conhecido como Mestre Pastinha, o principal representante da capoeira angola, modalidade de capoeira tradicional que angariou uma legião de adeptos em todo Brasil.

1982 – Extinção do Partido dos Panteras Negras, organização que surgiu na cidade de Oakland, no estado da Califórnia (EUA), em 1966, para lutar pelos direitos da população negra. Intercedendo pela autodefesa dos afro-americanos e adotando a saudação de punhos erguidos (o poder negro) articulada aos imperativos do black is beautiful, a organização converteu-se em referência política e simbólica na luta antirracista e na afirmação identitária dos negros na diáspora.

5/05/1981 – É fundado o bloco afro Muzenza do Reggae, no bairro da Liberdade, como um tributo ao músico jamaicano Bob Marley.

11/05/1981 – Morre Robert Nesta Marley (Jamaica, 1945 – EUA, 1981), mais conhecido como Bob Marley, o maior ícone do reggae e o rastafári mais influente da história.

21/08/1982 – Início do III Congresso de Cultura Negra das Américas, evento que ocorreu em São Paulo e mobilizou lideranças de vários países das Américas para discutir a cultura africana e diaspórica no contexto social e político da região.

20/11/1982 – Integrando uma comitiva que contava com a presença do artista e ativista Abdias Nascimento (Franca, 1914 – Rio de Janeiro, 2011), Mãe Hilda Jitolu realiza uma cerimônia fúnebre para as vítimas da chacina do Quilombo dos Palmares, na Serra da Barriga, no estado de Alagoas.

4/08/1983 – Após insurreição popular, sobe ao poder em Burkina Faso Thomas Sankara (Burkina Faso, 1949-1987), político anticolonialista.

1984 – Gravação do primeiro disco do Ilê Aiyê, Canto Negro I.

15/07/1984 – Acontece a Primeira Conferência sobre a Mulher Negra nas Américas, no Equador.

16/10/1984 – O arcebispo sul-africano Desmond Tutu (África do Sul, 1931) recebe o Prêmio Nobel da Paz.

31/01/1986 – A Serra da Barriga é tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

14/08/1986 – Morre a ialorixá Mãe Menininha do Gantois [Maria Escolástica da Conceição Nazaré (Salvador, 1894-1986)], baluarte da luta contra a intolerância religiosa em Salvador.

16/10/1986 – Wole Soyinka (Nigéria, 1934) torna-se o primeiro escritor africano a receber o Prêmio Nobel de Literatura.

19/10/1986 – Samora Machel (Moçambique, 1933 – África do Sul, 1986), primeiro presidente de Moçambique, é morto após um atentado que atingiu o avião em que viajava, enquanto sobrevoava o espaço aéreo da África do Sul.

1987 – Benim e Bahia começaram a estreitar relações, com a ida ao país africano do então prefeito de Salvador e de uma comitiva da qual o Ilê Aiyê fez parte. A partir disso, teve início um intercâmbio cultural, com a inauguração, no Pelourinho, da Casa do Benin, e a instalação, no país africano, da Casa do Brasil.

15/10/1987 – Em Burkina Faso, o presidente Thomas Sankara (Burkina Faso, 1949-1987), colocado no poder por um levante popular, é assassinado por golpistas.

1988 – Criação da Escola Mãe Hilda, dentro do terreiro Ilê Axé Jitolu, para crianças do Curuzu, em Salvador. Suas práticas educacionais incluem histórias de luta e resistência do povo negro no currículo escolar.

2/02/1988 – Plenário da Constituinte aprova a emenda de autoria do deputado Carlos Alberto Caó Oliveira (Salvador, 1941 – Rio de Janeiro, 2018) estabelecendo o racismo como crime inafiançável e imprescritível no Brasil.

13/05/1988 – Centenário da Abolição da Escravatura no Brasil, o último país do Ocidente a extinguir o regime de cativeiro. Dois dias antes, ocorreu a Marcha contra a Farsa da Abolição, no centro do Rio de Janeiro.

22/08/1988 – Criada a Fundação Cultural Palmares, instituição pública vinculada ao Ministério da Cultura que tem como principal atribuição promover a valorização da cultura negra.

5/10/1988 – Promulgada a Constituição Federal, também conhecida como Constituição Cidadã, que reconhece, no art. 68 das Disposições Transitórias, o direito à terra das comunidades remanescentes de quilombos.

2/12/1988 – Realização do I Encontro Nacional de Mulheres Negras, em Valença, no Rio de Janeiro, reunindo 450 mulheres negras de 19 estados.

1989 – Gravação do segundo disco do Ilê Aiyê, Canto Negro II.

 

 

Década de 1990

1990 – A cantora Margareth Menezes (Salvador, 1962) é convidada por David Byrne (Reino Unido, 1952), fundador do grupo Talking Heads, para fazer a abertura de sua turnê mundial, Rei Momo. O espetáculo passa pela América do Sul, pela América do Norte, pela Europa e pela Ásia, num total de 42 países.

11/02/1990 – Nelson Mandela (África do Sul, 1918-2013) é libertado depois de 27 de prisão, na África do Sul.

21/03/1990 – A Namíbia, um país da África Setentrional e última colônia no continente, conquista a independência da África do Sul.

Década de 1990 – As músicas dos blocos afros da Bahia (Ilê Aiyê, Olodum, Araketu, Muzenza, Badauê) e a chamada axé music emplacam de vez no show business, caindo no gosto popular. Foi nesse contexto que o Olodum gravou com artistas como Paul Simon (EUA, 1941), em 1990, e Michael Jackson (EUA, 1958-2009), em 1996, alcançando sucesso internacional.

14/11/1991 – Realização do I Encontro Nacional de Entidades Negras (Enen), na capital paulista. Ao final do evento, foi criada a Coordenação Nacional de Entidades Negras (Conen), que representou a articulação das novas forças atuantes no movimento negro brasileiro.

1992 – Lançamento do disco O Canto da Cidade, de Daniela Mercury (Salvador, 1965). O álbum contém a música “O Mais Belo dos Belos”, uma versão que une duas canções do Ilê Aiyê: “A Verdade do Ilê” e “O Charme da Liberdade”.

25/07/1992 – Instituído o Dia da Mulher Afro-Latino-Americana e Caribenha.

1993 – Publicação do The Black Atlantic: Modernity and Double Consciousness (O Atlântico Negro. Modernidade e Dupla Consciência), livro do sociólogo Paul Gilroy (Reino Unido, 1956), que divulgou o termo hoje mais empregado por quem tenta refletir sobre a dinâmica cultural da afro-diáspora: Atlântico Negro, uma rede transnacional de conexões e trocas de experiências, estilos, símbolos, projetos e ideais tecidos durante a diáspora africana pelas populações negras entre a África, as Américas, o Caribe e a Europa.

15/10/1993 – Nelson Mandela ganha o Prêmio Nobel da Paz.

1993 – É fundada a Associação Educativa e Cultural Didá, de onde nasce a Banda Didá, formada apenas por mulheres. Sua estreia ocorre no Carnaval de Salvador em 1994.

1994 – Fim do regime de segregação racial, apartheid, na África do Sul; Nelson Mandela vence as primeiras eleições democráticas, tornando-se o primeiro presidente negro do país.

1995 – Fundação do Projeto de Extensão Pedagógica do Ilê Aiyê. Mãe Hilda acolhe 50 professores das escolas públicas do bairro da Liberdade, em Salvador, para capacitação.

20/11/1995 – Dia da Marcha Zumbi dos Palmares, que arregimentou em Brasília cerca de 30 mil pessoas contra o racismo, pela cidadania e pela vida.

1995 – I Encontro Nacional das Comunidades Negras Rurais Quilombolas, conclave realizado em Brasília. No ano seguinte, houve a criação da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq).

1996 – Gravação do terceiro disco do Ilê Aiyê, Canto Negro III.

27/02/1996 – O governo federal realiza a cerimônia de instalação do Grupo de Trabalho Interministerial para Valorização da População Negra (GTI), no Palácio do Planalto, em Brasília.

17/08/1997 – Início do V Congresso Afro-Brasileiro, em Salvador, evento que reuniu pesquisadores da história, cultura e identidades negras.

1997 – A V Conferência Mundial da Tradição dos Orixás e Cultura (Comtoc) é realizada na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos.

1997 – O Bando de Teatro Olodum, grupo que promove o teatro negro em Salvador e que revelou nomes como Lázaro Ramos (Salvador, 1978) e Érico Brás (Salvador, 1979), leva para o palco do Teatro Vila Velha a peça Cabaré da Raça, que discute a questão racial no Brasil. A partir dali o Bando circulou em turnê por várias cidades do país, além de se apresentar em Angola e Portugal.

1998 – Gravação do disco Ilê Aiyê 25 Anos.

1998 – Lançamento do premiado documentário Atlântico Negro: na Rota dos Orixás, dirigido por Renato Barbieri. Trata-se de uma viagem pelo circuito do Atlântico Negro, em busca dos fluxos e refluxos das relações históricas e culturais que existem entre o Brasil e a África, especialmente no campo da religiosidade. Historiadores, antropólogos e sacerdotes africanos e brasileiros relatam fatos históricos e dados surpreendentes sobre as diversas afinidades culturais que unem os dois lados do Atlântico. Filmado no Benim, no Maranhão e na Bahia.

2/07/1998 – É fundado o bloco Cortejo Afro, nascido também dentro de um terreiro de candomblé, o Ilê Axé Oyá, na comunidade de Pirajá, em Salvador.

 

 

Década de 2000

28/07/2000 – O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), por meio do Ministério da Cultura, tomba o terreiro de candomblé Ilê Axé Opô Afonjá, em Salvador, declarando-o patrimônio cultural brasileiro.

22/04/2000 – Na data do “descobrimento” do Brasil, os movimentos negro, indígena e popular realizam uma grande manifestação (Brasil: Outros 500) contra o racismo e as desigualdades sociais, em Porto Seguro, na Bahia.

31/08/2001 – Início da Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerâncias Correlatas, que foi realizada em Durban, na África do Sul, e contou com uma delegação brasileira.

2001 – São dados os primeiros passos para a implementação de cotas raciais em instituições públicas de ensino superior pelas universidades estaduais do Rio de Janeiro e da Bahia. A primeira universidade federal a adotar uma política de reserva de vagas para negros e índios foi a Universidade de Brasília (UnB), em 2004.

9/01/2003 – Promulgação da Lei Federal nº 10.639, que tornou obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileiras e africanas na rede pública de ensino.

21/03/2003 – Fundada a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), na data emblemática em que é celebrado o Dia Internacional de Luta pela Eliminação da Discriminação Racial.

11/2003 – É inaugurada no Curuzu, em Salvador, a Senzala do Barro Preto, sede do bloco afro Ilê Aiyê – um edifício de oito andares com espaço para as festas da beleza negra e as demais atividades de ensino e formação do grupo, que, além de música e dança, incluem cursos profissionalizantes e a Escola Mãe Hilda. O prédio abriga ainda um estúdio.

24/10/2005 – Morre Rosa Parks (Rosa Louise McCauley – EUA, 1913-2005), símbolo da luta pelos direitos civis nos Estados Unidos.

12/06/2006 – Início da Conferência de Intelectuais da África e da Diáspora ocorrida em Salvador, cujo tema principal é a diáspora e o renascimento africano.

24/11/2006 – Início do I Encontro Nacional de Clubes e Sociedades Negras, conclave que ocorreu em Santa Maria (RS) e reuniu mais de 300 pessoas.

27/12/2007 – Instituído o Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa.

2008 – Surge um movimento de transição capilar que ganha as ruas de Salvador, capitaneado por mulheres negras que abandonam a prática de alisamento e, em seu lugar, ostentam seus cabelos crespos e cacheados.

4/11/2008 – Barack Obama (Havaí, 1961) é eleito presidente dos Estados Unidos, tornando-se o primeiro negro a governar o país.

25/06/2009 – Morre Michael Jackson, cantor, compositor e dançarino afro-americano, considerado por alguns analistas como “o maior ícone negro da música” no século XX. Sua obra musical teve grande importância para a aceitação da música negra como música pop.

19/09/2009 – Morre a ialorixá Mãe Hilda Jitolu, importante liderança religiosa que cuidava do terreiro Ilê Axé Jitolu, berço do Ilê Aiyê.

Década de 2010

20/07/2010 – Lei Federal institui o Estatuto da Igualdade Racial, destinado a garantir à população afro-brasileira a efetivação da igualdade de oportunidades, a defesa dos direitos étnicos individuais, coletivos e difusos e o combate à discriminação e às demais formas de intolerância étnica.

10/12/2010 – Início do III Festival Mundial das Artes Negras, em Dakar, capital do Senegal. Com o tema Renascimento Africano, nessa edição a proposta foi transmitir uma nova visão da África: liberta, orgulhosa, criativa e empoderada. Mais de 3 mil artistas, oriundos de 84 países, exibiram a melhor produção cultural de África e da diáspora. O Brasil foi convidado especial.

Década de 2010 – A estética do continente africano tem se tornado referência de moda para as passarelas de várias partes do mundo, fazendo a cabeça, o corpo e os pés de homens e mulheres do Atlântico Negro.

23/05/2011 – Morre Abdias Nascimento, um dos maiores líderes no combate à discriminação racial no Brasil.

26/04/2012 – O Supremo Tribunal Federal (STF) decide por unanimidade que as cotas raciais nas universidades brasileiras são constitucionais.

2013 – O Festival de Herança Negra de Lagos, na Nigéria, homenageia Abdias Nascimento como figura emblemática das relações Brasil-Nigéria e da política pan-africanista.

2014 – O Afoxé Filhos de Gandhy, uma das entidades pioneiras de matrizes africanas de Salvador, celebra 65 anos de fundação.

2015 – Gravação do CD e do DVD comemorativo dos 40 anos do Ilê Aiyê, Bonito de se Ver.

24/08/2015 – A Campanha Reaja ou Será Morto ou Será Morta, um movimento pan-africanista que denuncia o chamado extermínio do povo negro, promove a terceira edição da Marcha Internacional Contra o Genocídio do Povo Negro. Ocupando as ruas do centro de Salvador, a marcha contou com participação expressiva da juventude negra.

18/11/2015 – Dia da Marcha das Mulheres Negras, que congregou na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, milhares de mulheres negras, com cabelos em estilo afro, turbantes, palavras de ordem, bandeiras, cartazes e, sobretudo, histórias de vida marcadas pela resistência ao racismo.

9/07/2016 – Uma onda de manifestações espalhou-se pelas principais cidades da Inglaterra, incluindo Londres, cobrando mais atenção das autoridades pela luta contra o racismo. Nos Estados Unidos, diversos manifestantes foram presos em protestos contra a violência policial. Um dos principais ativistas do movimento black lives matter [Vidas de Negros Importam], DeRay Mckesson (EUA, 1985), foi detido durante um ato em Baton Rouge, capital do estado de Luisiana.

14/03/2018 – Assassinato de Marielle Franco (Rio de Janeiro, 1979-2018) e de seu motorista, Anderson Gomes (Rio de Janeiro, 1979-2018), no Rio de Janeiro. Marielle era negra, socióloga, lésbica e vereadora e se notabilizou pela defesa dos direitos humanos. O crime chocou a opinião pública nacional e internacional, gerando homenagens, protestos e atos de indignação em todo o país.

13/05/2018 – 130 anos da Abolição da Escravatura no Brasil. Denúncias de trabalho análogo à escravidão ainda persistem na imprensa.

18/07/2018 – Centenário de nascimento de Nelson Mandela, ou Madiba, como também é conhecido popularmente na África do Sul. O tema do Carnaval do Ilê Aiyê é Mandela – a Azânia celebra o centenário de seu Madiba.

18/08/2018 – Morre Kofi Annan (Gana, 1938 – Suíça, 2018), diplomata que esteve de 1997 a 2006 no cargo de secretário-geral da ONU e que recebeu em 2001 o Prêmio Nobel da Paz. Foi destaque em ações relacionadas ao combate da Aids e da pobreza e à resolução de conflitos, sobretudo em países africanos.