De cidadão baiano a cidadão do mundo, Milton teve uma trajetória profissional marcada pelo rigor metodológico, pela busca constante em entender o funcionamento do mundo através do território e de seus usos. Como professor e pesquisador, trabalhou em diversas instituições brasileiras, como a Universidade Católica de Salvador (UcSal), a Universidade Federal da Bahia (UFBA) e a Universidade de São Paulo (USP). Internacionalmente, foi professor nas universidades de Toulouse, Bordeaux e Paris (Sorbonne), na França; e na Universidade Central da Venezuela, na de Toronto (Canadá) e de Dar Es-Salaam (Tanzânia), entre muitas outras; e ainda pesquisador no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos.
Além dos trabalhos acadêmicos, Milton foi consultor da Organização das Nações Unidas (ONU), da Organização Internacional do Trabalho (OIT), da Organização dos Estados Americanos (OEA) e da Unesco. Também prestou consultoria na Venezuela, na Argélia e na Guiné-Bissau. Como jornalista, foi redator do jornal A Tarde, da Bahia, além de diretor da Imprensa Oficial da Bahia.
Intelectual premiadíssimo, Milton recebeu 20 títulos de doutor honoris causa de universidades de diversos países. O título é concedido a personalidades que se destacam em suas áreas de atuação pela relevância de seus trabalhos para a sociedade. Em 1994, ele recebeu o Prêmio Vautrin Lud, do Festival internacional de geografia da França, considerado o Nobel da área. É o primeiro e único latino-americano a ser agraciado pelo prêmio até hoje.
Com uma trajetória de tanto prestígio, seu legado enraizou-se no imaginário brasileiro, especialmente em indivíduos, organizações e instituições engajadas na luta social. Um de seus grandes legados é a Bolsa Milton Santos, um programa criado por Marie-Hélène Tiercelin dos Santos, esposa e viúva do intelectual, de apoio financeiro a jovens estudantes da UFBA para projetos de iniciação científica, mestrado e doutorado. O escritor e geógrafo Itamar Vieira Junior foi o primeiro aluno a ser contemplado pela bolsa.
Uma de suas últimas obras, Por uma outra globalização (2000) apresenta de maneira objetiva e acessível alguns dos conceitos e teorias de Milton em relação à globalização e ao período técnico-científico-informacional. Analisando as características principais do mundo globalizado, do funcionamento do mundo capitalista e de suas contradições, o autor busca entender as dores e problemas do mundo, expondo suas incongruências e paradoxos, para propor um novo caminho, mais humano e libertário, de civilização que tem na periferia do mundo seus principais protagonistas. Com uma análise que, num primeiro momento, pode parecer pessimista – por tudo o que Milton Santos revela da realidade do mundo –, a obra é um farol de esperança deixado por um dos maiores intelectuais do país e do mundo.
A densidade teórica e metodológica de Milton, frequentemente citada como impedimento para o acesso à sua obra, é o ponto de partida e chegada do engajamento público do pensador. Apesar de suas ideias ainda terem resistência em parte da academia brasileira, seu pensamento segue vivo fora dos muros das universidades: na luta por moradia e nos movimentos negros e pelo acesso e permanência estudantil de pessoas pretas, indígenas, pobres e periféricas.
Autonomeado “ativista das ideias”, o intelectual que reconheceu na periferia do mundo e nos homens e mulheres comuns a força para a transformação do mundo segue como inspiração para aqueles por quem tanto lutou.