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Visão de mundo

Mario Pedrosa viveu intensamente o século XX. Dono de uma conversa fácil, inteligente e bem-humorada, criou em torno de si uma sociabilidade generosa e aberta, que marcou seu contato com um vasto universo de artistas, intelectuais e políticos. Figura cosmopolita, teve uma vida em constante deslocamento por inúmeros países e capitais do mundo – devido aos muitos períodos de exílio e às viagens ligadas à sua atuação como crítico de arte.

Nascido em 25 de abril de 1900, no Engenho Jussaral, distrito de Cruangi, em Timbaúba (PE), filho de Pedro da Cunha Pedrosa e Antônia Xavier de Andrade Pedrosa, Mario Xavier de Andrade Pedrosa foi o sexto de dez irmãos. Aos 2 anos de idade, mudou-se com a família para João Pessoa (PB), onde o pai se dedicou à advocacia e à política.

Aos 13 anos, foi enviado para estudar na Bélgica, contudo os eventos da Primeira Guerra Mundial fizeram o destino mudar para Lausanne, na Suíça. Naquele momento, Pedrosa começou a ter contato com o mundo e a formar seu pensamento e sua visão, que marcaram sua trajetória.

Abaixo, apresentamos uma linha do tempo com momentos importantes de seus 81 anos de vida.

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Após formação na Suíça, Mario retorna ao Brasil e ingressa na Faculdade Nacional de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, onde aprofunda seu interesse pelo marxismo. Nesse período, frequenta a casa de Arinda e Frank Houston em Niterói, onde conhece Mary Houston, sua parceira por toda a vida.

Após a graduação, muda-se para São Paulo e passa a trabalhar no Diário da Noite e a produzir artigos de crítica literária. Frequenta os meios literários paulistas e faz amizade com o escritor Mario de Andrade. Pouco depois, em 1925, adere ao Partido Comunista Brasileiro (PCB).

Enviado à Rússia pelo PCB para estudos, Mario Pedrosa, primeiro por questões de saúde, depois pelo contato com o ideário do revolucionário Leon Trótski, permanece na Alemanha. Cursa aí filosofia e sociologia e estuda a gestalt, uma teoria da percepção. No ano seguinte, em Paris, na França, encontra com escritores surrealistas.

Pouco depois de sua expulsão do PCB por ser trotskista, Mario Pedrosa é preso pela primeira vez. Com Lívio Xavier, redige o ensaio "Esboço de uma análise da situação econômica e social do Brasil". Um ano depois, em São Paulo, ele é preso novamente, desta vez com Mary Houston, pelas tropas de Getúlio Vargas.

Em 7 de outubro, Pedrosa é baleado durante a Batalha da Praça da Sé, confronto entre militantes antifascistas e integralistas apoiados pelas Forças de Segurança Nacional. O período é marcado pelo crescente envolvimento do crítico com a Frente Única Antifascista (FUA), organização fundada em 1933 em São Paulo.

Após o golpe de Estado organizado por Getúlio Vargas, a repressão aumenta e Pedrosa é processado. Segue clandestinamente à França. No ano seguinte, nos Estados Unidos, no contexto da Quarta Internacional – organização comunista trotskista –, integra discussões sobre a posição da União Soviética quanto à Segunda Guerra Mundial.

Após passar a Segunda Guerra Mundial em Nova York e regressar ao Brasil, o crítico é preso e exilado pela segunda vez, voltando para os Estados Unidos. No Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA), ele conhece o artista visual Alexander Calder, que influenciou imensamente sua visão crítica e social sobre a arte moderna.

De volta ao Rio de Janeiro, Mario Pedrosa conhece o projeto da psiquiatra Nise da Silveira e do pintor Almir Mavignier com pacientes psiquiátricos. A experiência lhe inspira o texto "Arte, necessidade vital". No ano seguinte, consolida-se ao redor dele o primeiro núcleo de artistas abstrato-concretos do Rio.

O crítico encabeça a modernização do Jornal do Brasil e assume a coluna de artes visuais. Atua na comissão de premiação da "4ª bienal de São Paulo". É indicado para uma bolsa de estudo do projeto Oriente-Ocidente, da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), que o levará em 1957 ao Japão.

Em São Paulo, Mario Pedrosa acumula os cargos de diretor do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) e de secretário-geral da "6ª bienal de São Paulo". Entre março e maio, a serviço da Bienal, percorre Peru, México, Estados Unidos, França, Holanda, Bélgica, Tchecoslováquia, Polônia, Itália, Espanha e União Soviética.

No Rio de Janeiro, candidata-se a deputado federal pelo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), mas não se elege. Os livros A opção imperialista e A opção brasileira são lançados. Mario publica artigos sobre arte contemporânea, entre os quais “Arte ambiental, arte pós-moderna, Hélio Oiticica”, no qual introduz o termo “pós-moderno”.

No Rio de Janeiro, Mario Pedrosa sofre uma isquemia após protestos contra a morte de estudantes pela ditadura militar. Após viagem à Polônia, é aconselhado a não voltar ao Brasil, devido ao Ato Institucional no 5 (AI-5). Segue então para Portugal. No ano seguinte, consegue que o espaço reservado ao Brasil na Bienal seja deixado vazio, como denúncia da repressão.

Processado por denunciar a violência do regime militar, Mario Pedrosa exila-se na embaixada do Chile no Rio de Janeiro. Após três meses, obtém salvo-conduto para viajar a Santiago, onde, em 1971, o então presidente Salvador Allende o encarrega da criação de um museu de arte moderna formado por doações. Ele dedica os dois anos seguintes a esse projeto.

O crítico retorna ao Chile dois dias antes do golpe militar que termina por assassinar Salvador Allende. A brutal repressão o obriga a se exilar na embaixada do México, onde permanece por 17 dias à espera de um salvo-conduto para deixar o país. Finalmente, viaja para a Cidade do México e, depois, para a França, onde recebe asilo político.

Pedrosa retorna ao México, onde apresenta o texto “Arte culta e arte popular”. No Brasil, é lançada a coletânea de artigos Mundo, homem, arte em crise, organizada pela professora Aracy Amaral. Um outro importante texto, “Discurso aos Tupiniquins ou Nambás”, é publicado pelo jornal Versus e em revistas de outros países.

Um ano após o retorno de Mario Pedrosa a Mary Houston ao Brasil, em razão da reabertura política, o MAM Rio é destruído por um incêndio. Mario defende que o espaço se torne o Museu das Origens, cujo projeto, não realizado, incluía a arte de crianças, indígenas, artesãos e esquizofrênicos.

Em fevereiro, ele vai a São Paulo, onde participa de um ato simbólico pela fundação do Partido dos Trabalhadores (PT) no Colégio Sion. Com Apolônio de Carvalho, importante militante de esquerda, assina a ficha de filiação número 1 do partido. Na mesma ocasião, recebe uma homenagem da Bienal de São Paulo.

No Rio de Janeiro, em 5 de novembro, Mario Pedrosa morre em seu apartamento vítima de câncer, aos 81 anos de idade. Muitas homenagens são prestadas por intelectuais e artistas. A ABCA cria o Prêmio Mario Pedrosa, que, ainda hoje, se dedica a distinguir anualmente um artista brasileiro.

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Mario Pedrosa aos 13 anos, antes de sua partida para a Suíça, 1913 imagem: autoria desconhecida Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

Mario Pedrosa aos 13 anos, antes de sua partida para a Suíça, 1913
imagem: autoria desconhecida
Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

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Uma trajetória singular, por Quito Pedrosa

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Em três períodos, Mario foi perseguido e exilado

Entre exílios políticos e viagens voluntárias ao exterior, Mario Pedrosa percorreu diversos lugares do mundo durante sua vida. Passou por Alemanha, Chile, Espanha, Estados Unidos, França, Japão, México, Peru, Portugal e Suíça, entre outros países.

Perseguido e obrigado a sair do Brasil em busca de segurança para si e para a família, Pedrosa passou por três exílios. O primeiro ocorreu em 1936, com a tomada do poder por Getúlio Vargas. Ele foi para a Europa usando o passaporte de um amigo, mas a perseguição à sua família continuou. Em 1938, sua companheira, Mary Houston, ficou presa por sete meses na Casa de Detenção, onde já estavam as militantes comunistas Patrícia Galvão – a Pagu – e Olga Benário e a psiquiatra Nise da Silveira.

Em 1941, Pedrosa tentou entrar no Brasil por terra, mas foi preso. Ali começou seu segundo exílio, que acabou apenas com o final da Segunda Guerra Mundial.

O terceiro e último exílio ocorreu na década de 1970, quando Mario, aos 70 anos, foi acusado de “tentativa de difamar o Governo Militar brasileiro com denúncias de supostas torturas nas prisões do país”. Em decorrência disso, ele terminaria se exilando no Chile. Esta carta aberta com mais de cem assinaturas de artistas e intelectuais foi encaminhada ao então presidente do Brasil, o general Emílio Garrastazu Médici, em protesto contra o mandado de prisão e responsabilizando o governo pela integridade física do crítico. Foi nesse período em Santiago que Pedrosa colaborou para a criação do Museu da Solidariedade Salvador Allende. Além do Chile, passou pelo México e pela França antes de retornar ao Brasil, em 1977.

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Um homem do mundo: entre exílios e colaborações

Os seus netos Quito e Bel Pedrosa e o jornalista Luiz Antônio Araujo falam de como essas experiências marcaram a visão pacifista, crítica e provocativa do pensador, bem como colaboraram para um entendimento da identidade do Brasil em sua total diversidade.

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“[...] graças às suas convicções, ele nunca permitiu que seu pensamento se cristalizasse e se transformasse em algo dogmático; ao contrário, produziu um pensamento em aberto, colocou-se no lugar da hiância – isto é, no intervalo entre o que não existia ainda e o que estava prestes a existir –, sempre atento à realidade, sem nunca deixar de levá-la em consideração; a radicalidade do real foi seu leme.”

Márcio Doctors em texto para a publicação desta mostra.

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Mary Houston e Mario Pedrosa em viagem para Bombaim, na Índia, 1959 imagem: autoria desconhecida Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

Mary Houston e Mario Pedrosa em viagem para Bombaim, na Índia, 1959
imagem: autoria desconhecida
Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

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Mario e Mary: parceria e resistência por toda vida

Intelectuais, revolucionários e parceiros – a vida conjunta do casal Mario Pedrosa e Mary Houston é uma história de alinhamento em várias esferas. Além de confidente e companheira, Mary cumpriu o papel de assistente de Mario, apoiando sua obra.

Mario conheceu Mary Houston quando ela ainda era muito jovem, em Niterói (RJ), na casa em que a mãe de Mary recebia os intelectuais que circulavam pelo Rio de Janeiro nos anos 1920. Em cinco décadas de relacionamento, uma imensa quantidade de cartas atesta a grande confiança que tinham um no outro, com conversas sobre o trabalho, a situação política do Brasil, dos amigos, as preocupações com a família e, principalmente, a saudade causada pelos diversos momentos de exílio político enfrentados pela família.

O casal teve uma filha, Vera Pedrosa (1936-2021), e os netos Quito, Bel e Lívia. A relação entre Mario e Mary, neste vídeo, é tema das falas do jornalista e escritor Luiz Antônio Araujo, do pensador e curador Marcio Doctors e do músico e artista visual Quito Pedrosa.

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Mary Houston, s.d. imagem: autoria desconhecida Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

Mary Houston, s.d.
imagem: autoria desconhecida
Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

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Lembranças do avô Mario

Bel e Quito Pedrosa, netos de Mario Pedrosa, recordam histórias do ambiente familiar. Presente nos dois anos finais de sua vida, Quito fala sobre a emoção de acompanhar o avô no lançamento do Partido dos Trabalhadores (PT).

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Mary Houston e Mario Pedrosa com sua filha, Vera Pedrosa, e os netos Isabel, Lívia e Quito Pedrosa, s.d. imagem: Roberto Krause Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

Mary Houston e Mario Pedrosa com sua filha, Vera Pedrosa, e os netos Isabel, Lívia e Quito Pedrosa, s.d.
imagem: Roberto Krause
Centro de Estudos do Movimento Operário Mario Pedrosa (Cemap) – Acervo Centro de Documentação e Memória da Universidade Estadual Paulista (Cedem/Unesp)

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Mario Pedrosa brincando o neto Quito Pedrosa, s.d. imagem: Roberto Krause acervo Família Pedrosa

Mario Pedrosa brincando com o neto Quito, s.d.
imagem: Roberto Krause
acervo Família Pedrosa

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